CONSCIÊNCIA
DE CULPA
Os
atos praticados durante a existência física insculpem-se de tal
forma nos painéis mentais do espírito, que permanecem vigorosos
mesmo depois do fenômeno orgânico da desencarnação.
Naturalmente
aqueles que mais geraram aflição predominam com mair rigor, impondo
comportamentos perturbadores que, não raro, transferem-se de uma
para outra existência, responsabilizando-se por distúrbios de
diferentes matizes.
Antes,
porém, de seres repassados às futuras existências carnais,
continuam vivos em imagens dolorosas na memória dos desencarnados,
que não se deram conta do traspasse, mantendo-se em deplorável
situação de aparente permanência no corpo.
Repetem-se-lhes
as imagens infelizes, num caleidoscópio sombrio, mantendo a confusão
mental em decorrência da gravidade de que se revestiram.
Permanecem,
neste estado, por demorado período, aqueles que se comprometeram,
até quando a Misericórdia Divina os desperta para novas condições
de consciência.
Se
foram vítimas, não havendo sido responsáveis pela ocorrência
lamentável, de menor duração é a perda do discernimento, porque,
mesmo nesse caso, os impositivos da Justiça Soberana manifestam-se,
convocando o antigo infrator ao ajustamento, ao equilíbrio de que se
afastara pela prática de hostilidades e crimes vergonhosos.
Quando,
no entanto, são responsáveis, em face de conduta irregular que
atrai outros companheiros moralmente semelhantes, o que resulta dessa
convivência infeliz é mais grave, pela opção elegida, geradora da
incúria em que se movimentavam.
De
qualquer forma, porém, a consciência de culpa
resuma nos refolhos da memória, embora não identificando o fator
causal responsável pela insegurança e sofrimento.
Esse
transtorno psicológico, portanto, tem sempre as suas raízes
fincadas nas atitudes reprocháveis que o espírito se permitiu e das
quais não conseguiu libertar-se, porque tem conhecimento de que as
não deveria ter praticado.
Dessa
forma, quando na Erraticidade, padece os conflitos que acumulou após
a prática do ato perverso e não se facultou reabilitação moral,
através da reparação junto ao ofendido ou em relação à
sociedade que poderia auxiliar no seu processo de evolução
espiritual.
Interiormente
reconhece a justeza do sofrimento, inconscientemente sabendo que
constitui instrumento de elevação. Equivoca-se, porém, na
interpretação dos seus resultados, porquanto, a necessidade da
reeducação não exige uma conduta de entrega inerme à dor, da qual
não resultem benefícios e propostas de elevação moral.
Sofrer
pelo simples fato de sofrer torna-se fenômeno inócuo no processo de
crescimento espiritual.
Todo
sofrimento deve fazer-se acompanhar de resultados opimos, aqueles que
amadurecem o ser, que lhe ampliam os horizontes do entendimento,
proporcionando serviço edificante, processo eficaz para contribuição
em favor da humanidade que prossegue carente de entendimento, afeto e
ajuda para o seu desenvolvimento ético e moral.
O
espírito cresce interiormente iluminando a consciência com as
diretrizes do dever que lhe constitui o estímulo para desenvolver as
aptidões internas, remanescentes das concessões do Criador, e que
lhe cumpre vivenciar, a fim de que se lhe fixem como mecanismo de
evolução.
Dessa
maneira, a culpa é
uma presença que deve ser removida logo seja possível, a fim de que
não se responsabilize por danos emocionais que devem ser evitados.
À
semelhança de um espinho cravado nas carnes da alma,
exerce uma função de advertência, ao invés de uma presença
punitiva, de forma que se desincumbindo do mister a que se destina,
seja retirada da consciência, que se deve abrir à alegria da
recuperação mental, colocando-se a serviço das aquisições de
novas bênçãos.
Tanto
se pode proceder terapeuticamente em relação à sua libertação,
durante a estância no mundo espiritual, pelo programar de novos
compromissos edificantes e através do esforço em favor da correção
da conduta, o que proporciona esperança e alegria, como transferir
para as próximas reencarnações, quando se apresentará
perturbadora em forma de conflito de mais difícil remoção.
Tendo-se
em vista que a vida é espiritual, cabe a todos o dever de
autoconscientização de que, operando a partir do mundo causal em
direção ao terreno, torna-se mais exequível a produção de
valores saudáveis do que no sentido inverso.
Desse
modo, a educação dos espíritos desencarnados, conforme ocorre nas
Esferas em que habitam, assim como através do intercâmbio valioso
nas reuniões mediúnicas, é de valor inestimável pelos resultados
obtidos.
Esclarecidos
a respeito das ocorrências inditosas e dos meios que se encontram ao
alcance para o depuramento, toda uma programação bem elaborada é
colocada a serviço da reabilitação pessoal, diminuindo a
ocorrência de gravames afligentes no decurso da existência carnal.
Nesse
capítulo, ainda outro benefício se pode auferir, que é o de evitar
mecanismos obsessivos, que resultariam da insidiosa presença da
vítima que encontraria as tomadas morais na culpa,
aplicando os plugues
do ressentimento, da ira, do desforço a que invariavelmente se
entregam os infelizes.
Terapeuticamente,
é um processo preventivo, libertador de mazelas, auxiliando o
deambulante carnal no crescimento mediante conquistas e realizações
edificantes, ao invés do cárcere sem grades dos resgates mais
difíceis que terá de enfrentar...
À
medida que o espírito se depura, mais se lhe acentuam os conceitos
morais e sociais, exigindo cuidados especiais na área do
comportamento, a fim de serem evitados esses transtornos do
arrependimento, em forma de culpa, da amargura, como efeito da ação
perpetrada e de que agora se dá conta a respeito da sua inutilidade,
tendo em vista as excelentes maneiras de avançar, gerando
felicidade.
Tornando-se
mais exigente com a própria conduta, nessa fase é possível amar
incondicionalmente, servir sem expectativa de retribuição, doar-se
de maneira natural, sem que isso constitua sacrifício, enfim, ser
útil em todas as circunstâncias do processo humano em o qual se
encontra colocado.
Embora
a presença da culpa
na consciência seja convite à recuperação moral e reeducativa do
infrator, lamentavelmente tipifica estágio inferior em que o
espírito transita, em face das concessões que se permite nos
contínuos compromissos inditosos.
Dia
virá, na sociedade terrestre, em que a consciência de
culpa será substituída pela
consciência do dever,
mediante cuja claridade será mais fácil a utilização dos
instrumentos ao alcance para o processo de renovação interior,
trabalhando em favor daqueles que foram prejudicados e contribuindo
para a edificação de uma sociedade, uma cultura nobre, bem como de
relacionamentos mais saudáveis.
O
tempo, portanto, que vige entre o erro w a sua recuperação está
determinado pelo esforço do infrator que se conscientiza, assumindo
a responsabilidade de mudança pessoal em relação a si mesmo e à
vida.
Os
ponteiros do relógio das oportunidades sempre volvem aos mesmos
lugares, porém, em circunstância e tempo diferentes, razão porque
sempre devem ser utilizados os momentos que se fazem propícios para
agir-se com acerto, equidade e respeito pelos demais.
Evitar-se,
pois, a presença da culpa na consciência é dever que a todos
cumpre considerar, desde que não faltam serviços reparadores,
oportunidades de procedimentos compatíveis com as leis estabelecidas
e os Códigos Divinos vigentes no Universo.
A
disposição consciente para a recuperação pessoal é o primeiro
passo para a libertação do conflito que se pretende estabelecer nos
painéis mentais, gerando transtorno nas paisagens comportamentais.
De
grande significação terapêutica o ensinamento de Jesus, quando
propõe àquele que se encontra em débito com o seu próximo,
conclamando-o a que vá fazer as pazes com
ele, antes de depositar a sua oferenda no altar,
porque é mais importante a conquista do equilíbrio interior e da
consciência de harmonia, do que a exaltação ao Senhor da vida, sem
respeito pela sua criação, particularmente em relação àquele que
é o seu irmão...
Solicitar
desculpas quando se erra, identificar o equívoco e reabilitar-se com
naturalidade, contribuir em favor dos ideais de desenvolvimento da
sociedade, trabalhar em cooperação com as obras edificantes,
tornam-se recursos valiosos para a liberação da culpa decorrente
dos processos equivocados que todos vivenciam durante a jornada
carnal.
Ninguém,
à exceção de Jesus, consegue o êxito total no empreendimento da
evolução, sem viver os diferentes estágios do erro e da correção,
do crime e da reabilitação, em face das heranças que permanecem no
ser que transitou pelas faixas primárias, que se caracterizam pela
supremacia do instinto, do impositivo da cadeia alimentar que impõe
a morte de umas em benefício de outras espécies.
O
leão que pretende dominar o grupo mata os filhotes da fêmea que
pretende submeter porque não lhe pertencem, passando, então, a
procriar os seus próprios, de forma a dar continuidade à espécie.
Essa
predominância da ferocidade transfere-se de uma para outra fase
durante a cadeia de desenvolvimento antropológico, atingindo o
período hominal com terríveis impulsos de destruir aquilo que não
lhe pertence...
Da
mesma forma, quando a fera lambe o descendente em carícia não
consciente, pode-se identificar a futura mãezinha osculando o filho
do futuro. Nesse treinamento que exige incontáveis experiências
evolutivas, o germe do amor está desenvolvendo-se e aprimorando-se
até alcançar o patamar elevado de beijar os filhos de todas as
mães, sem discriminação ou preferência.
A
consciência de culpa,
portanto, tendo atendida a sua finalidade, dilui-se e transforma-se
na alegria de o indivíduo reeducar-se e viver plenamente conforme os
deveres que abraça, na sociedade em que se encontra colocado para
evoluir.
MIRANDA,
Manoel P. Reencontro com a vida. Salvador, Leal, 2006. p 183-8.