quarta-feira, 22 de agosto de 2012


SINAIS DOS TEMPOS





       1. - São chegados os tempos, dizem-nos de todas as partes, marcados por Deus, em que grandes acontecimentos se vão dar para a regeneração da Humanidade. Em que sentido se devem entender essas palavras proféticas? Para os incrédulos, nenhuma importância têm; aos seus olhos, nada mais exprimem do que uma crença pueril, sem fundamento. Para a maioria dos crentes, elas apresentam qualquer coisa de místico e de sobrenatural, parecendo-lhes prenunciadoras da subversão das leis da Natureza. São igualmente errôneas ambas essas interpretações; a primeira, porque envolve uma negação da Providência; a segunda, porque tais palavras não anunciam a perturbação das leis da Natureza, mas o cumprimento dessas leis.
 

2. - Tudo na criação é harmonia; tudo revela uma providência que não se desmente, nem nas menores, nem nas maiores coisas. Temos pois, que afastar, desde logo, toda ideia de capricho, por inconciliável com a sabedoria divina. Em segundo lugar, se a nossa época está designada para a realização de certas coisas, é que estas têm uma razão de ser na marcha do conjunto.


       Isto posto, diremos que o nosso globo, como tudo o que existe, está submetido à lei do progresso. Ele progride, fisicamente, pela transformação dos elementos que o compõem e, moralmente, pela depuração dos Espíritos encarnados e desencarnados que o povoam. Ambos esses progressos se realizam paralelamente, porquanto o melhoramento da habitação guarda relação como habitante. Fisicamente, o globo terráqueo há experimentado transformações que a Ciência tem comprovado e que o tornaram sucessivamente habitável por seres cada vez mais aperfeiçoados. Moralmente, a Humanidade progride pelo desenvolvimento da inteligência, do senso moral e do abrandamento dos costumes. Ao mesmo tempo que o melhoramento do globo se opera sob a ação das forças materiais, os homens para isso concorrem pelos esforços de sua inteligência. Saneiam as regiões insalubres, tornam mais fáceis as comunicações e mais produtiva a terra.



       De duas maneiras se executa esse duplo progresso: uma, lenta, gradual e insensível; a outra, caracterizada por mudanças bruscas a cada uma das quais corresponde um movimento ascensional mais rápido, que assinala, mediante impressões bem acentuadas, os períodos progressivos da Humanidade. Esses movimentos, subordinados, quanto às particularidades, ao livre-arbítrio dos homens, são, decerto modo, fatais em seu conjunto, porque estão sujeitos a leis, como os que se verificam na germinação, no crescimento e na maturidade das plantas. Por isso é que o movimento progressivo se efetua, às vezes, de modo parcial, isto é, limitado a uma raça ou a uma nação, doutras vezes, de modo geral.
 

         O progresso da Humanidade se cumpre, pois, em virtude de uma lei. Ora, como todas as leis da Natureza são obra eterna da sabedoria e da presciência divinas, tudo o que é feito dessas leis resulta da vontade de Deus, não de uma vontade acidental e caprichosa, mas de uma vontade imutável. Quando, por conseguinte, a Humanidade está madura para subir um degrau, pode dizer-se que são chegados os tempos marcados por Deus, como se pode dizer também que, em tal estação, eles chegam para a maturação dos frutos e colheita.



       3.- Do fato de ser inevitável, porque é da natureza o movimento progressivo da Humanidade, não se segue que Deus lhe seja indiferente e que, depois de ter estabelecido leis, se haja recolhido à inação, deixando que as coisas caminhem por si sós. Sem dúvida, suas leis são eternas e imutáveis, mas porque a sua própria vontade é eterna e constante e porque seu pensamento anima sem interrupção todas as coisas. Esse pensamento, que em tudo penetra, é a força inteligente e permanente que mantém a harmonia em tudo. Cessasse ele um só instante de atuar e o Universo seria como um relógio sem pêndulo regulador. Deus, pois, vela incessantemente pela execução de suas leis e os Espíritos que povoam o espaço são seus ministros, encarregados de atender aos pormenores, dentro das atribuições que correspondem ao grau de adiantamento que tenham alcançado.



       4.- O Universo é, ao mesmo tempo, um mecanismo incomensurável, acionado por um número incontável de inteligências, e um imenso governo em o qual cada ser inteligente tem a sua parte de ação sob as vista do soberano Senhor, cuja vontade única mantém por toda a parte a unidade. Sob o império dessa vasta potência reguladora, tudo se move, tudo funciona em perfeita ordem. Onde nos parece haver perturbações, o que há são movimentos parciais e isolados, que se nos afiguram irregulares apenas porque circunscrita é a nossa visão. Se lhes pudéssemos abarcar o conjunto, veríamos que tais irregularidades são apenas aparentes e que se harmonizam com o todo.



        5.- A Humanidade tem realizado, até o presente, incontestáveis progressos. Os homens, com sua inteligência, chegaram a resultados que jamais haviam alcançado, sob o ponto de vista das ciências, das artes e do bem-estar material. Resta-lhes ainda um imenso progresso a realizar: o de fazerem que entre si reinem a caridade, a fraternidade, a solidariedade, que lhes assegurem o bem-estar moral. Não poderiam consegui-lo nem com suas crenças, nem com suas instituições antiquadas, restos de outra idade, boas para certa época, suficientes para um estado transitório, mas que, havendo dado tudo o que comportavam, seriam hoje um entrave. Já não é somente de desenvolver a inteligência o de que os homens necessitam, mas de elevar o sentimento e, para isso, faz-se preciso destruir tudo o que superexcite neles o egoísmo e o orgulho.


       Tal o período em que doravante vão entrar e que marcará uma das fases principais da vida da Humanidade. Essa fase, que neste momento se elabora, é o complemento indispensável do estado precedente, como o da idade viril o é da juventude. Ela podia, pois, ser prevista e predita de antemão e é por isso que se diz que são chegados os tempos determinados por Deus.
 


       6.- Nestes tempos, porém, não se trata de uma mudança parcial, de uma renovação limitada a certa região, ou a um povo, a uma raça. Trata-se de um movimento universal, a operar-se no sentido do progresso moral. Uma nova ordem de coisas tende a estabelecer-se, e os homens, que mais opostos lhe são, para ela trabalham a seu mau grado. A geração futura, desembaraçada das escórias do velho mundo e formada de elementos mais depurados, se achará possuída de ideias e de sentimentos muito diversos dos da geração presente, que se vai a passo de gigante. O velho mundo estará morto e apenas viverá na História, como o estão hoje os tempos da Idade Média, com seus costumes bárbaros e suas crenças supersticiosas.



       Aliás, todos sabem quanto ainda deixa a desejar a atual ordem de coisas. Depois de se haver, de certo modo, considerado todo o bem-estar material, produto da inteligência, logra-se compreender que o complemento desse bem-estar somente pode achar-se no desenvolvimento moral. Quanto mais se avança, mais se sente o que falta, sem que, entretanto, se possa ainda definir claramente o que seja: é isso efeito do trabalho íntimo que se opera em prol da regeneração. Surgem desejos, aspirações, que são como que o pressentimento de um estado melhor.


7.- Mas, uma mudança tão radical como a que se está elaborando não pode realizar-se sem comoções. Há, inevitavelmente, luta de ideias. Desse conflito forçosamente se originarão passageiras perturbações, até que op terreno se ache aplanado e restabelecido o equilíbrio. É, pois, da luta das ideias que surgirão os graves acontecimentos preditos e não de cataclismos ou catástrofes puramente materiais. Os cataclismos gerais foram consequência do estado de formação da Terra. Hoje, não são mais as entranhas do planeta que se agitam: são as da Humanidade.



       (A GÊNESE, Cap. XVIII, p 401-5)




segunda-feira, 20 de agosto de 2012

PODER

          As heranças do primarismo da evolução remanescem na criatura humana induzindo-a à posse como mecanismo de segurança e de autorrealização, fenômeno decorrente também das exigências do ego que lhe predomina como força de difícil controle.

          Consequentemente, a estrutura da sociedade se organiza tendo como apoio a proposta do poder, que tudo parece resolver, projetando o indivíduo à felicidade e o grupo ao triunfo.

         O poder, dessa forma, se torna o objetivo quase essencial que deve ser conquistado por muitos, porquanto ele favorece o ter, que seria indispensável para uma existência confortável, assinalada pela comodidade e pelo prazer.

         Esse poder se expressa de mil formas diferentes arrastando as multidões que se lhe submetem, e atirando-as ao campo de batalha das competições destrutivas, nas quais os indivíduos se transformam em adversários, quando deveriam se unir em favor do progresso auxiliando-se reciprocamente.

         O impulso do poder só torna, às vezes, tão irresistível que, mesmo no hercúleo esforço da transformação moral da pessoa para melhor, reponta em forma de exibicionismo quando a sua ainda não é uma humildade verdadeira, ou de pressão sobre os outros, em conflito de transferência doentia do que gostaria de fazer e não se encoraja a realizá-lo, o que não ocorre por virtude, mas sim, por frustração.

         Nas experiências primeiras, o espécime mais forte sempre venceu o menos equipado, o que permitiu ao homem mais tarde usar a astúcia e a inteligência para dominar os animais de grande porte, assim como controlar as forças do planeta que lhe ameaçavam a existência.

        Ao alcançar o patamar da razão lúcida, permaneceu-lhe o conceito de sobrepor-se aos demais como forma de autorrealização, mesmo que inconscientemente, o que o tem conduzido a tutas tão desgastantes que desnecessárias.

       O poder funciona como instrumento de intimidação, de projeção, de vaidade, despertando inveja nos fracos e interesses apaixonados nos inseguros.

         Não são poucos aqueles que tudo empenham para a conquista do poder, a fim de receberem a bajulação doentia dos que se locupletam com os sobejos das suas extravagâncias. E o fazem, perdendo os melhores momentos da existência, no afã de se tornarem temidos, face à certeza de que têm de não conseguirem ser amados.

        Mas o poder defrauda todos aqueles que nele confiam.

        O poder da juventude cede lugar ao da maturidade, e essa à velhice com os seus desajustes e demências.

       O poder do dinheiro não compra tudo quanto se faz necessário para a plenitude, embora auxilie a avidez, diminuindo algumas dores e desconfortos, que podem ressurgir em forma de angústias morais e frustrações profundas por falta de amor verdadeiro.

       O poder público e o religioso se transferem de mãos a cada momento, quando outros mais ousados derrubam os sistemas ou alteram as Constituições que lhes ofereciam base.

       O poder da cultura, decorrente da inteligência brilhante e da memória privilegiada, decresce e desaparece com o envelhecimento, as enfermidades degenerativas, os golpes inesperados que produzem traumas crânio-encefálicos...

      Qualquer tipo de poder terrreno, a morte, por mais demorada de chegar, termina por diluir.

       Fama e poder – eis os dois pilotis feitos de fantasia em razão da precariedade da sua duração!

      Somente o poder do amor se transfere para além do túmulo, acompanhando o ser na sua escalada ascensional no rumo da Vida.

       Quando Jesus se encontrava diante de Pilatos, esse Lhe disse que representava o poder, ao que o Mestre, imperturbável, lhe respondeu que ele o tinha porque lhe houvera sido concedido, mas que não era dele próprio.

         A sua força transitória entregou-O aos inimigos, que puderam sacrificá-lO porque estava nos desígnios de Deus, mas não impediu que Ele retornasse vivo e exuberante, dando prosseguimento ao ministério que viera realizar na Terra.

      Posteriormente, o poder de Pilatos passou, como o de todo o Império romano, desaparecendo a falsa glória e a opulência ilusória, enquanto Ele permaneceu real, vibrando nas mentes e nos corações que O amam e anelam por encontrá-lO.

 O poder real é aquele que decorre dos valores intelectomorais adquiridos a esforço e perseverança, que facultam o crescimento interior projetando o Espírito para Deus.

        Esse poder, porém, quando se instala na mente e no coração, ao invés de perturbar, libera as paixões, dulcifica e harmoniza, tornando aquele que o possui um centro de irradiação de amor e paz que a todos mimetiza.

       Esforçar-se por conquistar esse poder iluminativo, deve ser a meta do indivíduo inteligente enquanto jornadeia na Terra, o que não o impede de adquirir outros poderes, a fim de que bem os possa utilizar, servindo a si e à Humanidade.

      Joanna de Ângelis, Luzes do Alvorecer. Salvador, Leal, 2001. p. 115-8.

quarta-feira, 15 de agosto de 2012

O QUE DIZER DOS TRABALHOS
DE PSICOGRAFIA, ATUALMENTE?


          PERGUNTA:
          Em razão do destaque que a mídia tem dado ao Espiritismo: filmes como Chico Xavier, Nosso Lar, Cartas de Chico Xavier, têm havido, na nossa Federação, quem sabe como nas demais, muitos e-mails pedindo onde se pode localizar um Centro onde se consiga uma psicografia. Infelizmente há Centros Espíritas que estão criando trabalhos nesse sentido, para atender ao público que vai lá e precisa de uma psicografia. Gostaria da sua opinião sobre isto.

          DIVALDO:
          Contou-nos Chico, pessoalmente, que durante muito tempo ele exerceu a mediunidade com Jesus através das mensagens, quando então Emmanuel começou o período do romance, aprimorando-lhe a capacidade de registro do Mundo Espiritual, porque os romances de Chico Xavier são tão notáveis que fi escrito um livro por um historiador, confirmando geograficamente todas as situações; sociologicamente, os hábitos da época. Mereceu de um grande estudioso fazer uma análise dos dados fornecidos por Emmanuel.


          Portanto, a mediunidade de romance é um grande desafio, porquanto os dados são transmitidos diretamente pela faculdade sonambúlica, evitando qualquer interferência dos registros do inconsciente pessoal do médium. Então, foi uma fase que ele exerceu muito bem. Quando Emmanuel prometeu aos amigos em Pedro Leopoldo falar a seu respeito em uma encarnação anterior, e vem Há 2000 anos.

          Depois dessa fase, ele vai para a revelação do Mundo Espiritual, e André Luiz apresenta-se como o grande revelador desse mundo transcendente de onde viemos, do qual nos esquecemos e para onde retornamos. Foi uma fase de grandes provas, porque as Entidades perversas que se homiziam na denominada erraticidade inferior, compraziam-se em ocultar isso das criaturas humanas, para rurpreendê-las, levá-las para os seus resgates dolorosos e exercerem a vingança em razão de seus débitos ancestrais.

          Mas ele suportou aquele período de difamações. Foi o período difícil, com a família de Humberto de Campos; foram os testemunhos na família pessoal; as grandes dores morais, como ele vai um dia falar sobre privilégios. Quando alguém disse que ele era um homem privilegiado, ele começa a relatar se é um privilégio perder a mãe aos 4 anos de idade, e vai relatando todo o calvário que ele suporta sorrindo, sem desanimar.

          Vem a fase André Luiz. André Luiz culmina com as obras científicas, através dele e do Waldo Vieira, na chamada correspondência cruzada: um numa cidade, o outro em outra cidade; um recebe o capítulo par, o outro o capítulo ímpar, provando a legitimidade do fenômeno mediúnico. Quando termina essa fase, aí começa o correio do além.

           Somente quando ele estava atingindo a maturidade superior, que ele denominara mediumnato; - ele havia atingido esse nível superior de mediunidade – é que vem a correspondência do além-túmulo.     E o correio de além-túmulo, que é muito difícil, muito sutil, exigia dele muitos sacrifícios, porque aqueles que chegavam chorando, aflitos para dar notícias, transmitiam-lhe as sensações da morte: as mortes por acidente; as mortes por suicídio eram choques vibratórios tremendos que o Dr. Bezerra amenizava.

          Um grande número dessas cartas – opinião pessoal – era redigido pelo Dr. Bezerra. O Espírito dizia o que desejava e o Dr. Bezerra relatava.

          Fazendo uma análise, pude observar que um grande número dessas cartas começa com um maneirismo muito comum em Minas Gerais: há 38 janeiros; há 10 janeiros, em vez de há 10 anos, há 30 anos; há tantos janeiros, e era também uma linguagem muito xavierina, que ele costumava utilizar.

          Então, eram mensagens não escritas pela Entidade cujos fluidos eram tão perturbadores que nesses equipamentos eletrônicos da mediunidade sublime de Chico Xavier poderiam causar danos. Nem todo mundo sabe manipular. É um aparelho muito delicado. Então, o Dr. Bezerra fazia-se o missivista, e na hora o Espírito assinava, pegando na mão do médium.

           Como nem sempre as assinaturas eram perfeitamente idênticas, o Chico um dia me falou assim:

          - Pensam que é fácil pegar a mão do médium e escrever. Quem desejar, pegue a mão de uma pessoa analfabeta e assine um cheque para ver se o banco paga.

          É a mesma coisa. O Espírito pega a mão do médium; centraliza no sistema nervoso central, pela glândula pineal, mas os influxos nervosos, por mais que sejam perfeitos, não vão reproduzir exatamente a caligrafia. Ela terá algumas nuanças muito bem estudadas pelo Dr. Perandréa, na obra em que ele analisa a psicografia do Chico.

          Então, a mim me chama atenção a leviandade com que muitos se propõem a psicografar mensagens de seres queridos, fazendo inquérito antes: anotando os nomes. Ficou tão vulgar a questão que me escrevem pedindo mensagens dizendo mais ou menos assim:

          É uma mensagem do meu filho que morreu dia tal; que fazia aniversário dia tal; cujo amigo é fulano, beltrano, sicrano, e no Além já estão sua avó Maria, Antônio. A mensagem já está pronta. É só dizer: Mamãe, estou com saudades, dê lembrança à titia, à vovó e assina. Induzindo. Já induzindo pela ânsia de querer notícia. E também virou modismo.

          Eu vi muitas vezes, em Uberaba – porque eu ia a Uberava duas ou três vezes por ano -, grupos de mães comentando: “Mas eu já recebi 10 mensagens do meu filho”. “Eu já recebi 32”. E o que é que fez das mensagens?

          E então se começou a publicar muitos livros dessas mensagens, que a mim não interessam. Interessam à família. Então, vêm essas mensagens que são muito pessoais, muito consoladoras e que devem ter um caráter muito criterioso. Se se publica para identificar, demonstrar a excelência da mediunidade, muito bem, mas não tem conteúdo doutrinário.

          Porque foram católicos; foram jovens que se deixaram consumir pela droga; foram jovens vitimados por acidentes, imaturos que vêm confirmar a sobrevivência.

          Então o que se dá? Surge agora a “indústria” das cartas do Além. Eu tenho lido algumas, porque me mandam. Eu leio, e elas não acrescentam nada. O que é mais lamentável – Eu li no livro Por trás de véu de Ísis, em que o repórter é biógrafo de Chico Xavier no livro anterior – alguém dizer assim:

          - Mas Chico também interrogava e anotava dados.

          Eu estarreci, porque jamais Chico Xavier perguntou qualquer dado a qualquer pessoa.

          Ele atendia 40 pessoas nas tardes de sexta-feira. Pessoas aflitas que chegavam, e ele ficava com papel, um lápis e uma tábua de apoio.

           Então o sujeito dizia: “Seu Chico, estou sofrendo muito”. Tomava o nome, para orar; anotava para transferir para o livrinho de preces. A pessoa pedia preces por familiares, e ele anotava. Chegavam com problemas de desencarnados. Ele dizia:

          - Sente-se ali e aguarde.

           Vi e ouvi inúmeras vezes. Ele jamais perguntou. E li na internet, o que pé muito pior, e gravei, porque li na internet, gravei e imprimi, que ele mandava alguém nas filas, perguntar às pessoas os dados, e no quartinho, a pessoa vinha trazer os dados para ele copiar.

           Primeiro, era necessário que ele tivesse uma memória prodigiosa, porque nome é muito abstrato. Nós normalmente vinculamos o nome da pessoa por tal ou qual característica. Um dos piores testes de memória é perguntar: “Qual é o meu nome?” Porque se não tiver algo que favoreça a associação de ideias, não lembra, porque o nome é uma designação momentânea, e então, uma acusação dessas, além de covarde, porque ele já desencarnou, é também criminosa, porque isso jamais aconteceu.

           E como eu sei? Porque eu estive muitas vezes vendo-o psicografar por horas a fio. Um dos grandes dramas que foi levado à Magistratura é de um rapaz de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, chamado João de Deus.

          Eu estava sentado à mesa. A reunião mediúnica de psicografia ia adiantada. Ao meu direito estava a dona Maria Edvirges Borges, Presidente da federação Espírita do Mato Grosso do Sul, quando alguém, pela janela, me entregou uma carta que era a mim dirigida. Essa carta dizia para que eu a entregasse a Chico.

            Casualmente eu olhei o remetente e coloquei a carta no bolso. A reunião continuou, e pela madrugada, depois de duas horas, Chico começou a ler as mensagens. E então, entre elas, ele dizia:

          - Tem aqui uma mensagem para João de Deus.

            Chamou pelo microfone, e ninguém veio. Ele disse:


           - Mas é uma mensagem de sua mulher desencarnada, para João de Deus.

          E deu o nome da desencarnada.

          Eu então me lembrei. Eu disse:

             - “Ué!”

          Apanhei a carta. João de Deus. Eu digo:

           - Chico, tem aqui uma carta para você, mandada do Mato Grosso do Sul, de Campo Grande, de uma pessoa chamada João de Deus.

            Publicamente ele disse:

           - Leia a carta.

          Eu abri e li para todo mundo ouvir:

          - Seu Chico, eu estou sendo processado sob suspeita de haver assassinado a minha mulher, mas eu não a assassinei. Era o dia do nosso aniversário de casamento, e tal. Então, eu peço que interceda junto dos Bons Espíritos para mandarem uma carta dela, uma coisa qualquer.

          E assinava: João de Deus.

          Dona Maria Edviges me disse:

          - Vamos ver o que é que ela diz.

          E começou a ler:

          - Ainda me recordo que naquela data do nosso aniversário de casamento, nós estivemos visitando a família de fulana de tal. Fizemos o lanche e depois visitamos beltrano e sicrano. Voltamos para casa e no momento em que você tirava o revólver do coldre e colocava na mesa de cabeceira, ele escorregou; tinha uma bala; o gatilho estava preso; disparou e me alcançou. Ainda me lembro.

          Ela narra e assina. Era a defesa dele.

          Então, Maria Edviges disse:

          - Mas, que interessante. Ele não está aqui, Chico.

          - A senhora leva a carta para ele.

           Maria Edviges tomou a carta, viajou para Campo Grande, entregou-lhe e ele entregou a carta ao seu advogado para provar que tudo o que ele havia dito, conforme estava nos autos, era exatamente o que ela vinha dizer do Além.

           Ele foi absolvido por unanimidade de votos.

           Apenas com esse caso, dá para demonstrar a grandeza da mediunidade.

           Então, é muito perigoso, porque, por outro lado, as pessoas também dão dados falsos, e eu vi, em Vitória da Conquista, numa Semana Espírita, uma médica que estava dilacerada pela morte do filho num acidente. Estando lá um desses médiuns de cartas do Além, ela deu todos os dados errados, para testar. E a mensagem veio com todos os dados errados. Ela ameaçou fazer um escândalo durante a Semana Espírita, mostrando que tudo era farsa.


           Eu cheguei, no dia seguinte, e então fomos apresentados, conversamos com ela, tentamos asserená-la. O Espiritismo não poderia responder pela leviandade de um indivíduo.

           Então, se por acaso o médium recebe – e todos os médiuns recebem, porque a mediunidade é neutra. Tanto vem um missivista do Além como um literato do Além. Não tem diferença. A questão é a capacidade do médium captar os dados muito abstratos: datas, nomes, acontecimentos, como nas mensagens que o Chico recebe, e muitas.

          Em muitos outros casos, os dados são impressionantes: a data do aniversário, as circunstâncias da morte.

          Então, quando a mim também perguntam:

          - Qual é o Centro a que eu devo recorrer para receber mensagem do meu marido, do meu filho?

            Eu digo que primeiro é necessário saber se eles têm condição de comunicar-se. E depois, ficar no Centro Espírita, porque, no momento azado, a Divindidade permitirá que o médium capte, senão pela psicografia, pela psicofonia, pela intuição, e receberá a informação desejada.

           Um detalhe ainda, que eu rogo permissão, e peço desculpas antecipadamente: Anunciar que o médium vai psicografar mensagens. Como é que ele sabe? Então, ele pode agora anunciar que vai receber mensagem? E se o Espírito não vier?

            Chico Xavier, quando alguém lhe perguntava:

           - Chico, você poderia receber uma mensagem?

            - Ah, Meu filho! O telefone toca de lá para cá.

            Ele nunca anunciou que ia receber. No programa Pinga Fogo, quando lhe pediram para psicografar, ele disse:



           - Vamos ver se o fenômeno acontece.
         Porque o médium é um instrumento. Ele não pode dizer que o fenômeno vai acontecer. Então, tenho lido na nossa imprensa: “A cidade tal vai receber o médium Antônio da Silva, ou Antônio da Silva Margarido, que vai psicografar cartas do Além. As pessoas podem inscrever-se.”


          


          Então, barateou muito o significado do Espiritismo. A pessoa recebe aquela carta. Aquela carta consola, é claro, mas dentro de algum tempo quer outra, como é inevitável, e o médium vai se transformar num correio particularista, a desserviço das atividades do Centro Espírita, que têm muitas atividades para serem exercidas pelo médium, não só na mediunidade, mas também para dar sopa aos pobres. Varrer a sala; arrumar as cadeiras. Essas tarefas não devem ser remuneradas, e os Centros Espíritas são constrangidos a remunerar pessoas. Chegamos e encontramos tudo arrumadinho, porque alguém arrumou. Encontramos o setor de higiene limpo; sanitários em ordem, achamos uma maravilha, mas alguém o fez. Quando é que nós vamos fazer? Quando é que o bom médium vai chegar, vai arrumar, vai preparar o ambiente, vai criar o clima para as atividades de passe? A tarefa do médium não é só receber Espíritos. É viver os postulados da Doutrina Espírita.

CONVERSANDO com Divaldo Franco – III. Curitiba (PR), FEP, 2011. p 75-84.

domingo, 12 de agosto de 2012

O PRIMEIRO ACESSO AO INCONSCIENTE


[…]
          O verdadeiro processo de individuação – isto é, a harmonização do consciente como nosso próprio centro interior (o núcleo psíquico) ou self – em geral começa inflingindo uma lesão à personalidade, acompanhada do consequente sofrimento. Esse choque inicial é uma espécie de “apelo”, apesar de nem sempre ser reconhecido como tal. Ao contrário, o ego sente-se tolhido nas suas vontades ou desejos e geralmente projeta essa frustração sobre qualquer objeto exterior. Ou seja, o ego passa a acusar Deus, a situação econômica, o chefe ou o cônjuge como responsáveis pela essa frustração.

          Algumas vezes tudo parece bem exteriormente, mas no seu íntimo, a pessoa está sofrendo de um tédio mortal que torna tudo vazio e sem sentido. Muitos mitos e contos de fada descrevem simbolicamente esse estágio inicial do processo de individuação, quando contam histórias de um rei que ficou doente ou envelheceu. Outras histórias característica são as do rei e rainha estéreis; ou a do monstro que rouba mulheres, crianças, cavalos e tesouros de um reino; ou a do demônio que impede o exército ou a armada de algum rei de seguir sua rota; ou da escuridão que cobre todas as terras; e ainda outras histórias sobre secas, inundações, geadas etc. Poderia se dizer que o encontro inicial com o self lança uma sombra sobre o futuro, ou que esse “amigo interior” aparece primeiro como um caçador que prepara sua armadilha para pegar o ego indefeso.

          Observamos nos mitos que a magia ou o talismã capaz de curar a desgraça de um rei ou de seu país são sempre alguma coisa muito peculiar. Em um determinado conto, por exemplo, “um melro branco” ou “um peixe com um anel de ouro nas guelras” podem ser os elementos necessários para a recuperação da saúde do rei. Em outro, o rei vai precisar da “água da vida”, ou dos “três fios de cabelo dourados da cabeça do Diabo”, ou ainda da “trança dourada de uma mulher” (e depois, naturalmente, da dona da trança). Seja ele qual for, o remédio para afastar o mal é sempre único e difícil de ser encontrado.

          Acontece exatamente o mesmo na crise inicial que marca a vida de um indivíduo. Procura-se algo impossível de achar ou a respeito do qual nada se sabe. Em tais momentos, qualquer conselho bem-intencionado e sensato é completamente inútil – seja para que a pessoa se torne mais responsável, para que tire umas férias, para que não trabalhe tanto (ou para que trabalhe mais), para que tenha maior (ou menor) tato humano, ou para que arranje um passatempo. Nada disso ajuda a pessoa, a não ser excepcionalmente. Só há uma atitude que parece alcançar algum resultado: voltar-se para as trevas que se aproximam, sem nenhum preconceito e com toda simplicidade, e tentar descobrir qual o seu objetivo secreto e o que vem solicitar do indivíduo.

          O propósito secreto das trevas que se avizinham geralmente é tão invulgar, tão especial e inesperado que, via de regra, só se consegue percebê-lo por meio de sonhos e das fantasias que brotam do inconsciente. Se focalizarmos nossa atenção sobre o inconsciente sem suposições precipitadas ou rejeições emocionais, o propósito há de surgir num fluxo de imagens simbólicas de grande proveito. Mas nem sempre isso acontece. Algumas vezes aparece, inicialmente, uma série de dolorosas constatações do que existe de errado em nós, e em nossas atitudes conscientes. Temos então que dar início a esse processo engolindo todo o tipo de verdades amargas.

(M L Von Franz, O processo de individuação, in O homem e seus símbolos (CGJung, org) Rio, Nova Fronteira, 2008. p 219-21)



sexta-feira, 10 de agosto de 2012

TRANSIÇÃO PLANETÁRIA E OS NOVOS TEMPOS

DIVALDO PEREIRA FRANCO*




          Senhoras, senhores, queridas irmãs, queridos irmãos espíritas, jovens, caros amigos internautas, caros amigos que nos acompanham através da Rádio Boa Nova, nossos votos cordiais de muita paz.

          Do ponto de vista psicológico, as criaturas humanas somos herdeiras de muitos mitos. Esses arquétipos que se encontram ínsitos em nosso inconsciente profundo respondem por muitos dos nossos conflitos, das nossas necessidades, das nossas buscas, porque invariavelmente trazemos culpas de atos impensados, de realizações infelizes, de comportamentos esdrúxulos, de fora da ética.

          É natural, portanto, que exista em nós uma boa quota de masoquismo e que façamos sempre o elogio do sofrimento, como na tradição cultural, o elogio da loucura ao invés da dedicação à ordem, à beleza, o encantamento e às coisas fascinantes da vida. Esse mecanismo de culpa exige do nosso comportamento a punição e é muito comum reencarnarmo-nos dominados pela timidez, por transtornos fóbicos, pela ansiedade e principalmente pelo medo de algo que não sabemos o que é.

          É a herança da culpa que está colocada em nosso mundo íntimo aguardando a oportunidade da reabilitação. Essa culpa individual responde pela culpa coletiva da sociedade, o que levou determinados indivíduos dotados de profetismo e de paranormalidade a apresentar um deus à imagem e à semelhança da própria criatura, com as suas paixões, com os seus sentimentos, predominando a imagem de um deus cruel, vingativo, insensível à nossa dor, perverso.

          A Jesus, na condição de psicoterapeuta especial, coube a sublime tarefa de desvelar Deus como sendo o amor, e de retirar de Deus aquela face antropomórfica para nos apresentar essa visão cósmica, a qual nos encontramos mergulhados, fascinados pelas sublimes leis de justiça, mas também de misericórdia, de amor e de compaixão.

É natural, dessa forma, que exista a culpa coletiva e naturalmente a necessidade de uma punitiva manifestação da Divindade. É por isso que, periodicamente, aparece, em nosso comportamento, as manifestações a respeito do fim do mundo, da destruição do mundo, em referindo-se ao planeta em que habitamos, da sua desintegração e uma série de desgraças que deveriam cair sobre a cabeça desses seres desditosos que somos nós. Essa necessidade punitiva olvida que Jesus veio exatamente para que nos libertássemos de qualquer manifestação de culpa, de pecado, através do Amor.

         O Espírito Joanna de Ângelis anota que nos dicionários do futuro desaparecerão duas palavras de nosso idioma: culpa e pecado. Porque a culpa, depois que está estabelecida, merece punição. E o pecado, exige o castigo correspondente. Essas palavras deverão ser substituídas pela responsabilidade. Não somos culpados pelos nossos erros, eles fazem parte do nosso processo antropológico da nossa evolução, da nossa ignorância a respeito da verdade. Então, ao invés de nos considerarmos culpados, devemos colocar em nossa mente, que somos responsáveis pelas consequências de nossos atos, bons ou negativos, porque serão esses atos negativos que nos ensinarão ao não mais os cometer.

          O Egrégio Codificador da Doutrina Espírita interrogou as entidades venerandas a respeito do bem, e esses mentores da humanidade elucidaram que o bem é tudo aquilo que é conforme às Leis de Deus. Equivale dizer que é tudo aquilo que está dentro dos soberanos códigos, que se encontram no Universo, e que o mal é a ausência deles. É a sua desobediência, deixando filosoficamente a impressão de que o mal não existe. O mal é resultado do equívoco, é semelhante a sombra que tem uma existência transitória até a chegada da Luz que a dilui.

          Dessa maneira, o bem sempre sobrepuja mesmo aquilo que em determinado momento pode parecer um grande mal, pois ensina o indivíduo a não mais tropeçar no que lhe proporciona desgaste, aflição, desagrado, injúria que nós chamaremos de mal. É natural, portanto, que com essa colocação otimista e justa da Boa Nova, essa culpa ancestral ceda lugar à responsabilidade da reabilitação pelos equívocos que praticamos ao largo do nosso processo reencarnacionista.
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 *Transcrição do início da conferência de Divaldo Pereira Franco "Transição Planetária e os Novos Tempos" em fevereiro de 2012 no 28° Congresso Espírita do Estado de Goiás

terça-feira, 7 de agosto de 2012



Bem-aventurados os pobres de espírito,
porque deles é o reino dos céus.



          Nesta primeira bem-aventurança, Cristo fala da principal característica que o discípulo precisa possuir, antes que esteja pronto para receber o que o mestre iluminado tem para lhe dar. Ele precisa ser pobre em espírito, noutras palavras, precisa ser humilde. Se uma pessoa orgulha-se do que sabe, da riqueza, da beleza ou da linhagem; se tem ideias preconcebidas do que seja a vida espiritual e de como deveria ser ensinada – então sua mente não está receptiva aos ensinamentos mais elevados. Lemos no Bhagavad Gita, o evangelho dos hindus:

“As almas iluminadas que perceberam a verdade hão de instruir-te no conhecimento de Brahma (o aspecto transcendental de Deus), se tu te prostrares diante delas, as interrogares e as servires como um discípulo.”

            Segundo um conto indiano, certo homem procurou um mestre e pediu-lhe para ser seu discípulo. Com intuição espiritual, percebeu o mestre que o homem não estava ainda preparado para ser instruído. Por isso lhe perguntou:

           - Você sabe o que precisa fazer apara ser meu discípulo?

           O homem respondeu que não e pediu ao mestre que lho dissesse.

          - Bem, disse o mestre, você precisa ir buscar água, apanhar lenha,cozinhar e trabalhar muitas horas em serviços pesados. Precisa também estudar. Está disposto a fazer tudo isto?

            O homem respondeu:

            - Sei agora o que o discípulo precisa fazer. Diga-me, por favor: e o mestre, o que ele faz?

            - Ah, o mestre fica sentado, e em sua maneira recolhida dá as instruções espirituais.


            - Entendi, disse o homem. - Nesse caso, não quero ser discípulo. Por que não faz de mim um mestre?

          Todos nós desejamos ser mestres. É preciso, porém, que antes de nos tornarmos mestres, aprendamos a ser discípulos. Precisamos aprender a humildade.

PRABHAVANANDA, Swami. O Sermão da Montanha segundo o Vedanta. São Paulo, Cultrix, 2009. p 21-2